Hemingway resgatou, dá pra dizer que popularizou (num mundo
que não lê), e dá pra dizer, ainda, eternizou na nossa finitude, os versos do
poeta inglês medieval John Donne, na abertura de “Por quem os sinos dobram”:
“A morte de qualquer homem me
diminui, porque eu sou parte da humanidade; e por isso, nunca procure saber por
quem os sinos dobram, eles dobram por ti”.
O poema é maior, esses são os últimos versos. E eu na
adolescência, quando fui tocado por ele,
o decorei todinho. Volta e meia, quando alguém morre, dependendo do
quanto me toca, lá vou eu recitando: “ nenhum homem é uma ilha, isolado em si
mesmo...”
Escrevo à propósito de Belchior, o maior gênio cearense e que
marcou toda a minha vida e continuará marcando pra sempre, com seus versos sem
igual. Foram noites infinita bebendo sua poesia. Serão sempre! Ele continuará vivo, claro, na
beleza que nos legou. Mais vivo do que nunca, nesse tempo em que a música
brasileira, virou sinônimo de baixaria, com a apologia do sexo e da bebedeira,
sem poesia, com os safadões que invadiram nossa vida, fazendo-a ainda mais
pobre. Na verdade, fazendo jus ao tempo triste e pobre que vivemos como nação.
A morte física de Belchior me diminui bastante, como me
diminuiu a morte de Lennon, Vinícius “e tanta gente que partiu”, porque sou
parte do gênero humano e ele faz parte do que o gênero tem de melhor. Mas
fica, paradoxalmente, agora que morreu,
cada vez mais vivo, como acontece com todo grande artista quando morre,
como Russo, Cazuza...
Saudemos, pois, a
imortalidade de Belchior, um cara que até no modo que escolheu para viver, foi
diferente desse admirável gado novo em que nos transformamos.
Deixo aqui, em reverência e agradecimento, uma letra, um
poema, em que Belchior fala justo de John Donne, num cruzamento da vida desses
dois gênios separados por 5 séculos, e que pouca gente deve ter se dado ao
trabalho de pesquisar quem era.
Ave
Belchior! Ave Donne! Ave a beleza que não há de morrer enquanto ecoarem
seus versos, apesar, acima e além de toda a pobreza que se canta (encanta?) por
aí.
Em Resposta
à Carta de Fã
Baby,
respondo enfim
aquela carta de fã
que você mandou pra mim.
aquela carta de fã
que você mandou pra mim.
Sabe,
quase que eu ia fazendo a canção tropical que você me pediu.
Mas quem sou eu, mentalidade mediana, para imitar Jorge Ben?
Por favor não confunda as coisas! toda a canção é vulgar!
Eu é que sou um cara difícil de domesticar.
Gato violento e cruel? ora, ora!
Você já ouviu falar em política? oh! não.
Mas quem sou eu, mentalidade mediana, para imitar Jorge Ben?
Por favor não confunda as coisas! toda a canção é vulgar!
Eu é que sou um cara difícil de domesticar.
Gato violento e cruel? ora, ora!
Você já ouviu falar em política? oh! não.
Poema, o que e um poema? Isto não
é do meu tempo
Tempo de sex drug and rock and roll, computador!
Mas não se engane! sou do poetariado,
Um roqueiro fingido, estreando a vida fácil, meu amor.
Obrigado pelo brando do subúrbio, pelo garoto de aluguel.
Não sou nenhum Alain Delon!
Pra terminar meu livro de cabeceira para ler com todo o corpo
e aquele de que fala a elegia de Donne.
Tempo de sex drug and rock and roll, computador!
Mas não se engane! sou do poetariado,
Um roqueiro fingido, estreando a vida fácil, meu amor.
Obrigado pelo brando do subúrbio, pelo garoto de aluguel.
Não sou nenhum Alain Delon!
Pra terminar meu livro de cabeceira para ler com todo o corpo
e aquele de que fala a elegia de Donne.