Nós homens nunca vamos saber o que sente uma mulher produzida, que se acha bonita e gostosa, pronta pra sair pro mundo e enfeitiçá-lo. Mas não se engane, ela não se arruma pra você.
Cena comum a todo o homem: a
espera pela mulher que se arruma. E
temos sempre a crença ou a ilusão
de que aquela ‘outra’ mulher que vai irromper na sala se embelezou, se fez
outra, diferente da mulher de todo dia, pra sair com a gente. Em outras
palavras, se produziu para nós. E você já reparou como a diferença é grande?
Não é só no perfume sensual, no brinco escolhido a dedo, no cabelo exuberante,
no calçado, na roupa sofrida, escolhida, vestida e por fim curtida com deleite
e prazer. Não, a mulher que recebemos com olhar entre encantado, orgulhoso e
ciumento é outra por dentro também. Nós homens nunca vamos saber o que sente
uma mulher produzida, que se acha bonita e gostosa, pronta pra sair pro mundo e
enfeitiçá-lo. Mas não se engane, ela não se arruma pra você. Antes, no tempo da
obediência, da subserviência, da dependência do homem, até podia ser. Afinal,
ele tinha que gostar, aprovar. Ele era o dono dela. Até no nome, que ela
passava a assinar com o sobrenome dele, pra marcar a propriedade. Mesmo assim
ouso arriscar que ela não se fazia mais bela só pra ele. Hoje, então, nem se
fala. Verdade um, nesse século 21: mais do que nunca a mulher se produz pra ela
mesma.Verdade dois: Não pensa um segundo em você. Ou só pensa um.
O filósofo francês Lipovestky diz
no livro A terceira mulher que a
mulher do século 21 está muito mais na dela do que na dos homens, quer dizer,
busca nas roupas e acessórios muito mais uma coisa, um sentimento “para-a-moda
do que um para-o-desejo- masculino”. Hoje, a mulher busca a beleza mais para
satisfazer a si mesma. Primeiro, bonita e gostosa para ela mesma. Depois, para
as outras mulheres, eternas e odiosas concorrentes; e bem depois, por último, para
os pobres homens, que querem ficar ricos só por causa delas.
Anos atrás, lembro quando Juliana Paes surgiu bem mais magra para a
gritaria indignada dos machos. Ela disse
que não queria ser a gostosona, que se gostava magra (parece que depois mudou de ideia); ela se fez magra para ela, basicamente,
e para as outras mulheres, segundamente. Porque todas querem ser mais magras.
Como disse o Jô Soares, todas (que estão ótimas) querem perder dois quilos.
Quem ama a Gisele Bündchen são as mulheres.
Mesmo que eu não compartilhe com meus colegas de gênero, a verdade é que
homens amam mulheres-melancias, mulheres-melões,
mulheres-qualquer-coisa-com-sustância.
Lipovestky ainda
diz em outro trecho que “... a
manequim, com suas linhas ‘cabide’ é um espetáculo destinado a seduzir
prioritariamente as mulheres... São elas
e não mais os homens que, em
nossas sociedades, constituem o público mais atento às figuras emblemáticas da
sedução feminina”. Com a manequim afirmam-se valores, critérios de beleza que
estão muito distantes do mundo masculino, muito longe da visão do homem do que
é ser uma mulher sedutora, gostosa. A nós, homens, cabe aceitar ou aceitar.
Essa mudança toda se deu na conseqüência lógica de
uma sociedade de consumo cada vez mais centrada no lazer, no prazer, na
individualidade. A nova cultura “desvalorizou um modelo de vida feminina mais
voltada para a família do que para si mesma, legitimou os desejos de viver mais
para si e por si”. A mulher vai para o trabalho, conquista sua individualidade,
constrói seu prazer. E aqui não estou julgando se isso é bom ou ruim, ou o que
isso tem de bom e de ruim.
As mulheres
mudaram, meu caro. Pronto e ponto. Atente às propagandas de calcinhas e sutiãs.
Elas não apelam mais tanto para o lado sedutor; falam de conforto, beleza e
liberdade para a mulher. Calcinhas e sutiãs incendiárias, só para aquelas horas
mesmo em que elas querem botar fogo na gente, bombeiros agora cobrados na
competência no uso de mangueiras e acessórios.
Então, meu parceiro de gênero, gozo e sofrimento,
prepare-se, a cada dia, para essa “terceira mulher” que já chegou. E aceite que
não é pra você que ela se produz. Elas são de outro planeta. Vinícius de Moraes
já tinha sacado, há tempo, isso em Testamento:
“Você, por exemplo, está aí com a boneca
do seu lado, linda e chiquérrima, crente que é o amo e senhor do material... É,
amigo, mas ela anda longe, perdida num mundo lírico e confuso, cheio de
canções, aventura e magia. E você nem sequer toca a sua alma. É, as mulheres
são muito estranhas, muito estranhas.”
Assino em
cima, do lado e embaixo.
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