sexta-feira, 8 de julho de 2016

O "DISBULHADOR" DE TRISTEZA


Da série "Andarolhando a cidade"



Rua Pedro Pereira, Fortaleza, 11h30. Seu Luiz “disbulha”, como diz, o feijão verde, um prato típico cearense. Com uma habilidade que me encantou, parei a olhar e, querendo ser gentil disse: “Bah, como o senhor é rápido nisso”. Sem levantar os olhos para mim, ele falou: “Tem valor nenhum isso, qualquer um faz”. Respondi: “Assim, como o senhor faz ainda não tinha visto.” Efeito zero. “Pois me dê um quilo”, pedi. Aí ele me olhou com seu olhar triste e agradeceu. Sorri para ele, agradeci, e saí pelo centro de Fortaleza com um quilo de feijão verde, sem saber o que fazer com aquilo. Pensei, ah, se cada vagem debulhada debulhasse uma tristezinha também... Ah, se ele soubesse que faz parte do encanto dessa cidade, essa gente humilde que vende tudo que nem se imagina. Essa gente que nem imagina o encanto que produz. Essa gente que é a alma dessa cidade. Seu olhar não seria tão triste. Mas somos assim, a beleza está em quem vê. A beleza de “disbulhar” o milho verde. Me fez bem nessa manhã. Mesmo no seu olhar triste e desconsolo eu vi beleza. A beleza do humano, por vezes demasiado humano, com suas dores e suas flores. Como disse Caetano: “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”. E lá me fui pelo centro, com um quilo de feijão triste nas mãos. Ou melhor, um quilo de feijão verde servido por mãos tristes. Pra mim tudo era belo.

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