terça-feira, 9 de agosto de 2016

A ARTE DE (DES)CRUZAR AS PERNAS


(revisado)

Porque a mulher conjuga, como o homem não sabe conjugar, o verbo esperar. Ela espera no bar, na festa, que o homem, normalmente já escolhido, venha conversar. Ela espera o sangue vir, depois espera ele ir. Se o sangue não vem, ela espera bebê. Nove meses de espera. Coisa que homem nenhum suportaria. Ela embala  o bebê e espera ele dormir. Ela espera o homem vir.

A mulher tem várias armas para derrubar, ou pelo menos bambolear um homem, no jogo da sedução. Uma das mais eficazes é o cruzar de pernas. Com saia ou vestido, claro. Aliás, essa é uma distinção - saia e vestido – que está além da minha compreensão. Tudo pra mim é saia ou tudo é vestido. Uma mulher que, diante de espécime macho, saiba cruzar as pernas e, o que é mais perturbador, saiba descruzá-las, soma pontos valiosos na planilha da sedução. A imortalidade de Sharon Stone está garantida não pela sua obra, mas pelos cinco segundos de seu cruzar e, principalmente, descruzar de pernas.
Antes de tudo, mais importante que tudo, acima de tudo, quase tudo: é preciso calma nessa hora, digo, nessa arte. É preciso ser mesmo lenta, câmara lenta – slow motion, para quem está mais acostumado ao português moderno. Aliás, a calma, um jeito devagar de fazer tudo, irmã gêmea da delicadeza, deveria ser a norma de todas as condutas da mulher. Na verdade, creio que as mulheres são mais lentas por natureza, e, por favor, eu estou elogiando. As ligeirinhas, agitadas, que me perdoem, mas não são o melhor do gênero. Foram corrompidas. Esses tempos de velocidade, de potência, de gente máquina, esse cruzamento doido de alma com tecnologia, que acelera tudo, isso é coisa de macho, mas acabou atingindo a mulher. Mas no fundo, na essência, ela tem a calma. Porque a mulher conjuga, como o homem não sabe conjugar, o verbo esperar. Ela espera no bar, na festa, que o homem, normalmente já escolhido, venha conversar. Ela espera o sangue vir, depois espera ele ir. Se o sangue não vem, ela espera bebê. Nove meses de espera. Coisa que homem nenhum suportaria. Ela embala  o bebê e espera ele dormir. Ela espera o homem vir. Rubem Braga escreveu aos 20 e poucos anos uma bela crônica sobre a mulher que espera homem. “Não importa que seja a esposa vulgar de um homem vulgar; e que no fim a história do atraso dele seja também vulgar, neste momento ela é a mulher esperando o homem”.
E quando um pneu do carro fura, a mulher simplesmente desce e ... espera alguém – homem, claro – para trocá-lo. No sexo, ela demora mais, e o homem, sem paciência, não espera como ela certamente esperaria. Depois, ela espera um papo carinhoso e ele não espera pra dormir. Até na hora da concepção se faz a diferença – 350 milhões de espermatozóides em louca carreira para chegar ao óvulo, que lentamente foi dos ovários para a trompa e lá, placidamente, espera o vencedor da corrida. O que não é diferente aqui de fora, onde o homem corre, corre, atrás de quem mesmo? Porra-louca dentro e fora.
Então, mulher, busque a calma se ela anda agitada dentro de você, que ela lhe pertence. A menos que você tenha 18 anos, ou por aí, porque aí é quase impossível. Vale para todas o que Afonso Romano escreveu sobre a mulher madura:

"Há uma serenidade em seus gestos, longe dos desperdícios da adolescência, quando se esbanjam pernas, braços e bocas ruidosas. A adolescente não sabe ainda os limites do seu corpo e vai florescendo estabanada. É como um nadador principiante, faz muitos barulhos, joga muita água para os lados. Enfim, desborda. A mulher madura nada no tempo e flui com a serenidade de um peixe. O silêncio em torno de seus gestos tem algo de repouso da garça sobre o lago."

Particularmente sempre disse  que mulher começa a virar gente depois dos 25. Homem, muitas vezes, nunca vira, vivendo sempre o roteiro que lhe escreveram. A mulher espera se reiventar. Para encerrar esse papo vejamos a localização do sexo no homem e na mulher. O homem, arma em riste; a mulher, algo escondido - um lugar quente, úmido, pra dentro, estranho, muito diferente do sexo dele, pra fora, solto no mundo (agite antes de usar). Mulher é interior e tudo que isso implica - emoção, sexto sentido, mistério, conotação; homem é exterior, e tudo que isso explica, denotação.
Dito isso, minha amiga, calma sempre e em tudo, que esse bicho apressado chamado homem corre tanto justamente pra chegar aí – um regaço morno, um cafuné de mãos delicadas, a paz depois da correria, sono abraçado numa nuvem: ela ressonando no seu ombro. Então, mãos à obra. Aliás, pernas. Mas bem devagarzinho.

Um comentário:

Unknown disse...

Belo texto grande Capa! Te admiro amigo!