O
filme Eu odeio Dia dos
Namorados, uma comédia
romântica de Nia
Vardalos, lançada há
alguns anos, mostra um quadro interessante para esse papo sobre nosso
medo de amar. Genevieve é uma florista que não quer envolvimento.
Todos os seus relacionamentos não passam do quinto encontro, para
evitar que surja o amor e, daí, sofrimento. Ela jura que assim é
feliz. Até, claro, que aparece um bonitão que a faz querer o sexto
encontro, o sétimo... E ele para no quinto, conforme o combinado.
Só então ela descobre que não queria amar para não sofrer o que
sua mãe sofrera com as traições de seu pai. Ela diz para si
mesma: “nenhum homem vai me fazer sofrer como mamãe sofreu”.
Voltando
à vida vivida, Fernando amou muito Raquel e quebrou a cara.
Romântico e apaixonado, era do tipo que ainda manda flores, estende
tapetes com toalhas para seu amor sair do banho, compra até algodão
doce e maçã do amor. Pessoas assim, geralmente encontram pessoas
não-assim. Resultado: agora ele foge do amor. Só ‘fica’, e
jura que é feliz com essa “solidão de mão em mão”, como toca
uma música por aí. Se ele continuasse a buscar a mulher para viver
um grande amor, talvez no próximo se desse pior ainda. E no
terceiro encontrasse alguém que curtisse flores, tapetes...
Enfim,
o ponto. Morremos de medo de amar. E os motivos são vários, como
vimos. Podem vir isolados, ou misturados. Resumindo, não queremos
amar porque já sofremos muito por amor e assim, acovardados,
perdemos o melhor da festa, como Fernando. Também não queremos
amar, embora na maioria das vezes nem tenhamos consciência disso,
porque nossas histórias familiares contam com perdas, rupturas e
‘faltas’ de amor, tal como Joana. Se não tive amor quando
criança, como vou lidar com esse sentimento agora que cresci, pelo
menos por fora? Se nunca andei de bicicleta antes, como vou saber
andar de bicicleta agora? Logo, passo a não gostar de bicicleta,
tiro-a da minha vida. E também não queremos amar porque, esse
tempo egoísta, narcisista, individualista que vivemos, nos grita que
o grande barato é a emoção, a intensidade das paixonites, a
quantidade dos “ficares”, das gozadas, sem alma no meio, assim
meio como a Genevieve do filme ali atrás. Amores líquidos, como
definiu Bauman no livro com esse nome. E como ele escreveu: “a
solidão por trás da porta fechada de um quarto com um telefone
celular à mão pode parecer uma condição menos arriscada e mais
segura do que compartilhar um terreno doméstico comum”.
O
filósofo francês Michel Lacroix, em O
culto da emoção,
nos alerta que vivemos a era do grito e não do suspiro, da
emoção-choque e não da contemplação. Buscamos,
desesperadamente, viver emoções, seja nos filmes violentos, nos
esportes radicais, nos relacionamentos tão loucos e intensos quanto
rápidos.. . que acabamos ficando insensíveis. Mais ou menos como o
astronauta que voando a milhares de quilômetros por hora tem a
sensação de estar parado. Não amando, seja por qual motivo for, e
vivendo uma vida covarde, mutante, cheia de emoções baratas e
baldias, cama em cama, bar em bar, corpo em corpo – e pretensamente
feliz - parecemos com o camarada que diante de um banquete, se
empanturra com as entradas e não chega ao prato principal. No máximo
vai beliscar a sobremesa.
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